Ontem,
preparando uma aula, decidi me utilizar da música “Epitáfio”. Estava há dias
pensando sobre o meu primeiro encontro do semestre letivo com minha turma de
Ensino Médio e demorava para me escolher o que eu queria usar.
Influenciada
pelas mensagens do Papa Francisco para os jovens na JMJ, eu pensava em levar
para meus alunos algo que pudesse motivá-los para a caminhada que está a sua
frente – esta até o final do ano, mas também a maior, da vida.
Na manhã de
ontem, logo cedo, li a crônica “O que o acaso decidiu”, de Soninha Francine, na
revista Vida Simples do mês passado. Identifiquei-me imediatamente, quando a
autora escreveu sobre planejar o que queremos fazer para melhor nos organizar.
Necessito disso! Gosto disso!
No entanto, o
enfoque do texto era justamente o contrário: quando vivenciamos algo que não
havíamos planejado e, de repente, descobrimos prazer nisso. Coisas simples como
ligar o rádio do carro e estar tocando uma de nossas músicas favoritas; ou
passear por um livraria e encontrar um livro que é a ‘cara’ de alguém especial.
Soninha denominou essas situações não planejadas de “acaso”. No lide de sua
crônica, lê-se: “Ser surpreendido pelo acaso, de vez em quando, tem lá seu
valor. Vale a pena experimentar!”.
Lembrei-me
imediatamente da música do Titãs que diz “o acaso vai me proteger/enquanto eu
andar distraído” e achei, finalmente, o texto que desejava levar para meus
alunos adolescentes.
Gosto muito
dessa música, “Epitáfio”; acho a construção textual interessantíssima e o
título, criativo e original. Mas, como sempre acontece quando lemos novamente um
texto já conhecido, descobri ontem, ao preparar minha aula, que não havia me
dado conta anteriormente da riqueza da mensagem dessa canção e do quanto
acredito no que ela diz.
Epitáfio é aquilo que fica escrito nas lápides
dos túmulos. Em grego antigo, significa “sobre a tumba”. Em geral, o objetivo é
homenagear a pessoa ali sepultada com algo que lembre como foi sua vida.
O texto é
construído com duas antíteses bastante interessantes: mais/menos, alegria/dor.
O eu lírico diz que deveria ter “amado, chorado e arriscado mais”; em contraposição,
que deveria “ter complicado, trabalhado e se importado menos com problemas
pequenos”. Ou seja, o eu lírico lamenta tanto algumas atitudes que teve quanto outras
que não teve.
Melancólica avaliação da vida,
que não fazemos somente ao final dela, mas diariamente. O desafio é não cair no
remorso ou na culpa, que destroem a pessoa psiquicamente, mas avaliar-se,
reconhecer erros, refletir sobre mudanças de postura. Enfim, aprender a viver!
Num outro momento,
o texto revela mais uma dificuldade da vida humana: a aceitação. Está em nós
uma necessidade de mudança e de transformação que é altamente positiva. Foi
isso o que levou nossa espécie a modificar seu ambiente e sua realidade ao
longo da História.
Por outro lado,
essa inquietação, que pode ser demonstrada em curiosidade ou intolerância, por
exemplo, às vezes nos faz querer modificar algo que não nos cabe. O eu lírico
diz: “Queria ter aceitado/As pessoas como elas são” e “Queria ter aceitado/ A
vida como ela é”.
Conseguir compreender
que há coisas que não cabem a nós mesmos mudar é sabedoria e não comodismo.
Essa compreensão é fundamental para que façamos escolhas e possamos nos dedicar
àquilo que precisa de nossa energia para mudar e poder deixar de lado o que não
nos é possível transformar.
A
antítese alegria/dor também é rica de significado. O eu lírico diz: “Cada um sabe a alegria/E a dor
que traz no coração...” e “A cada um cabe a alegria/E a tristeza que vier...”.
Vejo isso como um paradoxo do equilíbrio: a vida não é alegre OU triste. Ela é alegre E triste.
Assim
como necessitamos enxergar as alegrias da vida (nem sempre é claro, às vezes
estamos míopes para essa visão...) e saber desfrutar delas, é importante não
cair no deslumbramento: haverá momentos sem alegria.
Do mesmo
modo ocorre com a tristeza. Conseguir experimentar a dor, sem simplesmente “escondê-la
embaixo do tapete”, e aprender com ela é essencial para aprender a viver. Mas é
preciso estar atento para se chegar apenas à beirada do poço, evitando seu
fundo, de onde fica difícil sair. Afinal, a tristeza também passa! E como diz
nosso poetinha: “É melhor ser alegre que ser triste...”.
Por fim,
gostaria de pensar sobre o ‘acaso’. No meu modo de entender, trata-se daquilo
que não pode ser planejado e que, a despeito de toda a experiência, preparação,
previsão - acontece. Acho que é a vida dizendo: “Olha, quem manda aqui sou eu.
Você pode muito, mas, certamente, NÃO PODE TUDO.”
Tentamos,
refletimos, procuramos estar atentos à vida. E eu dizia isso aos meus alunos,
ao fazer toda a reflexão acima: é importante estar atento, ter foco, se
preparar para o que se deseja. Eles são jovens e eu preciso dizer a eles que
essa atitude faz toda diferença.
No
entanto, preciso dizer, também, que o controle da vida não está em nossas mãos,
por melhor que seja nosso estudo e por melhor embasados que estejam nossos
planos. A dimensão da espiritualidade tem de estar presente para que esse
conjunto se complete e para me dar o suporte de que necessito quando saio do
meu ponto de equilíbrio e me distraio...
Acredito
que aí esteja o sagrado, o divino, a que cada religião chama de um modo. Na minha,
chamo de Deus, que se revelou na pessoa de Jesus Cristo, e não tenho dúvida de
que “ele vai me proteger, enquanto eu andar distraído”.
Amo a letra dessa musica!
ResponderExcluirGostaria que se aprofundasse mais na questão do "estar distraído". Por qual motivo? Em relação a quê?
ResponderExcluirTambém gostaria.
Excluir