Nosso imaginário cultural tem na figura de Hércules o grande herói que
vence pela força. Na língua portuguesa temos o adjetivo “hercúleo”, que pode
designar algo que é extraordinário, excepcional, fabuloso como Hércules.
Ao lermos
a mitologia grega, porém, vamos ver que Hércules é muito mais do que alguém com
extraordinária força e valentia. Hércules cresceu forte. Ou seja, desde cedo,
observou-se suas potencialidades físicas. Mas é interessante observar que ele
cresceu também intempestivo. Se fisicamente forte, emocionalmente era frágil:
reagia de modo inesperado e quase sempre inoportuno. Sua vida foi marcada por
situações extremas em consequência de duas de suas características: força e
fragilidade desmedidas.
Adulto,
Hércules destrói sua família: mata esposa e filhos, tomado por furor, raiva e
demência que a deusa Hera lhe enviou como vingança. Ou será que Hércules
não suportou as dificuldades da construção diária de um lar e usou sua maior
qualidade - a força- para acabar com tudo? Seria, sem dúvida, um caminho mais
rápido, a despeito do quão trágico seja.
Seja como
for, Hércules voltou a si e se arrependeu. Para se redimir, foi submetido aos
mandos do rei Euristeu, que lhe imputou terríveis trabalhos. Parecia que,
tomado de inveja pela força descomunal de Hércules, Euristeu desejava
mostrar-lhe que ela não era tão fenomenal assim. Obviamente, Euristeu não
era um sábio, desejando provocar reflexões em Hércules. Era apenas alguém que
em medíocre inveja se ocupa de perturbar o outro.
Fato é
que, é possível perceber que a força física de Hércules não era mesmo fenomenal,
no sentido de ser um valor que lhe fizesse superar todos os obstáculos. Lendo
atentamente o que ficou conhecido como “os doze trabalhos de Hércules”,
descobrimos que alguns não foram resolvidos pelo personagem; outros
necessitaram mais de inteligência do que de força; para uns, Hércules precisou
de astúcia, para outros, de paciência.
Para mim,
aí está a grande lição sobre esse herói: em cada um de nós, há muitas forças e
fraquezas. Saber reconhecer cada uma delas é importante para alcançarmos vitória
– seja qual for a nossa “competição”. Prefiro os significados do adjetivo
hercúleo como “aquilo que demanda um esforço excessivo; que é muito árduo ou
difícil de ser realizado”. Algo que necessita de determinação, mas que não pode
abrir mão da dedicação e do sacrifício – Hércules mostra bem isso.
Por fim,
lembrar de que contar com o outro é sempre necessário – lição que o personagem
também nos ensina. As redes de relações podem nos fortalecer, fazer-nos
enxergar nossas dificuldades pessoais e descobrir no outro algo que nos falta.
Hércules
partiu sozinho para realizar sua missão, contando com sua força descomunal. Venceu
seus desafios. Mas precisou identificar em si outras características valiosas,
além de ter descoberto parceiros pelo caminho. Tomara que meus alunos
adolescentes, com quem li essa obra, possam compreender essa beleza da vida: é
ela quem é hercúlea; por isso, precisamos reunir todo tipo de força – tanto a
física quanto a emocional – para superar as dificuldades e cumprirmos as
missões que formos recebendo, algumas vezes sozinhos, mas muitas vezes em
parceria.
“Se você quer ir rápido, vá sozinho.
Se quer ir longe, vá acompanhado.”
Provérbio africano
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