sexta-feira, 16 de março de 2012

Aprendendo sobre luto: mais uma experiência com os gatos

Na escola, aprendemos que as características dos seres vivos, que os distinguem dos seres sem vida, são: nascer, crescer, reproduzir-se, envelhecer e morrer. Os animais vivem isso plenamente. Com relação à última etapa da vida, morrendo de forma natural ou acidental, os que ficam experimentam essa passagem com a naturalidade que só é possível aos chamados seres irracionais.
Nós, seres humanos, somos os únicos que sabemos que existimos. Desde o momento em que nascemos, caminhamos para a morte e nos tornamos, pouco a pouco, conscientes dela, pelas experiências próprias ou dos outros.
Numa livre interpretação do pensamento do filósofo Blasé Pascal, “O homem é um nada, um miserável, um caniço frágil comparado à existência. Mas ele é o único que sabe que existe e que vai morrer. Isso o torna grande, nobre, admirável.”
No entanto, como bem diz o provérbio popular, “o feitiço vira contra o feiticeiro”. Ou seja, aquilo que parece uma grande vantagem, custa um alto preço. Saber que vamos morrer significa lidar com a ansiedade de que isso não ocorra durante a vida, mas só ao final dela. E é desejar que esse fim demore muito a chegar. E que chegue da melhor forma possível (todo mundo sonha em morrer velhinho e dormindo...). E é tentar viver de modo a aproveitar ao máximo antes do término da caminhada.
Por isso, os pais, para educar os filhos para o bem, precisam ensinar sobre a morte. Ensinam sobre os perigos físicos da vida, ensinando os filhos a preservar sua saúde e evitar a morte prematura. Ensinam sobre hábitos saudáveis de alimentação, higiene e lazer, a fim de fazer com que a vida física e psíquica seja prolongada. Assim, os filhos vão vivendo e aprendendo a desfrutar da vida plenamente e afastar a morte de si, o máximo possível.
Mas a morte existe. E então é preciso ensinar sobre espiritualidade e mostrar que há algo além da vida terrena. Há esperança. Se não acreditamos nisso, não é possível viver em plenitude (ou em abundância, com disse Jesus). E é importante que as crianças aprendam essa lição desde cedo, para que cultivem a esperança e possam aproveitar a vida alegremente.
Mas a morte é uma realidade. E dói. Dói pela perda. Dói pela ausência. Esta semana, um dos filhotes de Julieta foi atropelado no quintal de nossa casa e o acidente foi fatal. Bem cedinho, pela manhã, meus filhos viveram sua primeira experiência de morte próxima. Tão perto espacialmente; tão perto na convivência.
Chantilly foi o último a nascer, no dia 24/01. Era branco, com pequenos detalhes acizentados.; 
seus olhos eram azuis. Era o mais calminho de todos; e tinha cara de ursinho de pelúcia.
O mais velho ficou muito aflito e triste ao ver o gatinho morto, mas teve a esperança de que uma visita do veterinário resolveria a situação. Mas não foi possível... e essa decepção-frustração causou-lhe grande dor. Miguel é muito autônomo; em muitos momentos, pragmático; às vezes, autossuficiente. Teve, naquelas circunstâncias, que lidar com sua impotência e a realidade da vida. Aceitou colo, inicialmente; depois, isolou-se, para extravasar a emoção; por fim, começou a elaborar sua dor tocando piano. Nossa proximidade, as lágrimas e a música foram alimento para sua superação. No dia seguinte, ele já falava sobre Chantilly estar nos nossos corações, tranquilamente e com sensibilidade, como lhe é próprio.
O mais novo demorou um pouco para se dar conta da fatalidade. E chorou muito, em muitos momentos, depois que “a ficha caiu”. Andou pela vizinhança, dando a notícia, com o rosto banhado de lágrimas; cantou, enquanto o irmão tocava. Augusto é muito sentimental e revela facilmente seus pensamentos e sentimentos. Muito reflexivo, procura compreender plenamente o que ocorre a sua volta. Fez várias perguntas para entender a realidade. “Por que Chantilly morreu se os gatos têm sete vidas?” “Chantilly está no mesmo céu onde as pessoas que morrem ficam?” “Mamãe e Papai, vocês acreditam que Chantilly está perto de Deus?”.
Para os pais, testemunhar a dor dos filhos é sempre muito duro. Em situações como essa, o desejo de nosso coração é o de querer viver aquilo no lugar do filho, protegendo-o do sofrimento. A razão, porém, mostra que isso não seria bom e, felizmente, não é possível. Assim, vemos nossos filhos crescerem, não só física, mas também emocionalmente. Com as experiências da vida, mesmo que só se tenha seis, sete anos de idade...
Conversamos com Miguel e Augusto sobre a morte de Chantilly, com muito amor, com eles em nosso colo, cercados pelos nossos abraços. Dissemos que a tristeza é normal e que não devemos escondê-la. Mas explicamos que é preciso que ela se vá e fique apenas a saudade. Essa não vai embora nunca, quando queremos bem a alguém, ainda que esse alguém seja o animal de estimação.
E confirmamos que nosso gatinho está no céu, sim, na companhia de Deus. Entendemos que para uma criança que enxerga Deus como um Pai, não seria aceitável que esse ser divino renegasse aqueles que foram criados por ele mesmo, conforme ensinamos aos nossos filhos.
E eu, pessoalmente, fico torcendo para que Chantilly esteja mesmo com Deus, refletindo sobre a seguinte palavra bíblica: “Porque o que sucede aos filhos dos homens sucede aos animais; o mesmo lhes sucede: como morre um, assim morre o outro, todos têm o mesmo fôlego de vida, e nenhuma vantagem tem o homem sobre os animais; porque tudo é vaidade.” (Eclesiastes 3:19). Que assim seja!
E que Deus conceda a nós, pais, a sabedoria para ensinar aos nossos filhos sobre a Graça que é viver, nos bons e nos maus momentos.

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